Minha inspiração de hoje é o gato da poesia de T. S. Eliot,
The Run Tum Tugger, no seu Old Possum’s Books of Pratical Cats:
The Rum Tum Tugger is a terrible bore:
When you let him in, then he wants to be out;
He's always on the wrong side of every door,
And as soon as he's at home, he'd like to get
about.
Em tradução livre:
Rum Tum Tugger é um aborrecimento terrível:
Quando você o deixa entrar, ele quer sair;
Ele está sempre do lado errado de cada porta,
E tão logo chega em
casa, já quer sair para passear.
Essa sensação de inadaptação, de estar sempre do lado errado
de cada porta, tem me acompanhado desde que tenho sentido com mais força os
sintomas da EM. A fadiga, as dificuldades cognitivas como problemas de memória
e falta de atenção, a própria dificuldade para caminhar ou permanecer em pé me
fazem uma pessoa mais arredia. Eu, que sou naturalmente tímida, tenho ficado muito
sozinha. Tenho vontade de sair, mas me sinto mal. É como se eu necessitasse de
períodos de descanso também durante as conversas e as situações sociais. Talvez
eu precise contar mais como me sinto para que os amigos saibam porque pareço
tão arisca, mas se me oferecem um café com um pouco de paciência, verão que sou
bem sociável.
Um pouco mais da ambiguidade felina nesse poema-comédia que
traduzi livremente em 97, em homenagem à gata Nina.
Solilóquio do gato de Hamlet
escrito pelo gato de Shakespeare
Ir para fora, e talvez
ficar lá
ou permanecer aqui
dentro, eis a questão:
se é melhor para um
gato agüentar
os tapas e golpes do
tempo inclemente
que a natureza chove
sobre aqueles que perambulam fora de casa,
ou tirar um cochilo
num cantinho do tapete
e, ressonando, fundir
as horas sólidas
que entopem com tempo
sombrio as brilhantes engrenagens do relógio,
e ficar esperando o
sino do jantar. Sentar; contemplar
o lado de fora;
em um olhar exprimir
um desejo de se
aventurar sem demora,
e então, quando a
porta se abrir, ficar parado
como que transfixado
pela dúvida. Espreitar; dormir;
sair sem saber quando
poderemos outra vez
retornar; e há a bola
de lã...;
pois se as patas
fossem feitas para desmanchar um nó
ou abrir uma fechadura
ou deslizar a trava de uma janela,
e sair e voltar fosse
tão simples
como quebrar uma
tigela,
que gato iria tolerar
os mesquinhos aborrecimentos domésticos,
os pontapés certeiros
da cozinheira, a vassoura do mordomo,
os cutucões
descuidados das crianças, as carícias nas orelhas,
os pisões no rabo e
todos os distúrbios diários
dos quais os pelos são
legatários? Se, por sua própria conta,
ele pudesse realizar
seu êxodo e regresso,
que gato temeria os
cães de raça,
ou tomaria cuidado ao
atravessar o jardim do vizinho?
Se não fosse o medo de
nossos gritos despercebidos
e dos arranhões em uma
porta trancada
que nenhuma garra pode
abrir,
quem iria preferir
suportar nossas faltas humanas
em vez de fugir para
misérias inimaginadas?
Assim, a precaução faz
de todos nós gatos domésticos;
e os pelos eriçados da
resolução
são amaciados pela
pálida escova do pensamento,
e quando nossas
escolhas trazem cargas tão penosas,
hesitamos no limiar da
decisão.
Henry Beard
Hamlet’s Cat’s Soliloquy, from Hamlet’s Cat
Poetry for Cats
Tradução livre - Eliane
C. Souza
14.11.97
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